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18 de Abril de 2024
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    A DEMOCRACIA E OS DIREITOS DAS MINORIAS - O CASO DAS CARTILHAS DO MEC

    A história humana mostra que a democracia é o melhor regime, dentre aqueles por nós experimentados. Ela conduz à legitimação do poder, pois o representante é alçado a essa condição pela maioria. Segue-se, então, que muito provavelmente as condutas implementadas pelo representante tenderá a contemplar aquela maioria, em suas expectativas. Nada mais normal.

    A modernidade tem apontado, no entanto, as limitações do modelo democrático, formado a partir da regra de maioria, notadamente no ponto em que deixa sem resposta adequada questões relativas aos direitos das minorias, uma vez não terem forças suficientes para serem ouvidas em suas necessidades.

    De fato, uma das limitações da democracia reside na ausência de garantia dos direitos daqueles pequenos grupos, com características diferentes daquelas dos grupos dominantes.

    A sociedade plural de hoje bem demonstra a necessidade da existência de uma especial proteção para os diferentes, o que conduz ao desafio posto: como, a um só tempo, preservar a democracia, como regra de expressão da maioria, e ainda assim assegurar o pleno exercício dos direitos das minorias?

    A solução passa pela construção do sentido da expressão “dignidade da pessoa humana”. Cuida-se de uma construção, pois passa pelo Texto Constitucional, mas é desafio diário, ininterrupto e geral.

    A Constituição Federal afirma, desde seu preâmbulo, a instituição de um estado democrático, destinado a assegurar, dentre outros direitos fundamentais, a igualdade e a justiça social, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social.

    Temos, portanto, como base do nosso sistema jurídico, político e social, a necessidade da convivência da democracia com a radical luta contra qualquer forma de preconceito, que atinge, por definição, minorias.

    A harmonização desses valores supremos é imperiosa e difícil, o que demanda o esforço de todos os atores sociais.

    O parâmetro a ser utilizado deve partir do pressuposto de que a ninguém é dado exercitar direito que implique o aniquilamento do direito do outro.

    O tema é atual em muitos campos, como por exemplo, na garantia dos direitos de portadores de deficiência, e no crescente movimento contra práticas homofóbicas.

    No tocante ao último tema, o termo homofobia aparece na obra “Society and the Health Homosexual”, autor George Weinberg (New York, St, Martin s press, 1972 com o significado clínico de medo e ódio por homossexuais.

    Condutas homofóbicas são escancaradamente contrárias aos termos constitucionais vistos e merecem, por isso, franca e imediata resposta estatal repressora.

    A orientação sexual não se mostra passível de controles e direcionamentos “a priori”, quer pelo Estado, quer por qualquer grupo social.

    Por outro lado, figura com freqüência nesse embate, o exercício da liberdade religiosa, que afora representar a liberdade constitucional de associação, também tem especial proteção, na Constituição Federal, ao afirmar-se ali a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, e ao se assegurar o livre exercício dos cultos religiosos, a proteção aos locais e sua liturgias. O Texto Constitucional sintomaticamente, também, veda aos entes públicos embaraçar o funcionamento dos cultos religiosos de qualquer credo (artigos VI e 19, I, ambos da Constituição Federal de 1988).

    A convivência entre os dois valores - liberdade religiosa e de expressão da sexualidade - se põe em pauta em episódios, reiterados, de veiculação ou tentativa de veiculação, de material pretensamente didático, de orientação sexual.

    Foi largamente noticiada a produção e tentativa de veiculação de material, sob os auspícios do Ministério da Educação, denominado imprópria e pejorativamente de “kit gay”.

    A análise do material demonstra sua inadequação e visível apologia ao comportamento homossexual, em suas diferentes vertentes de possibilidades. Esse e outros temas exigem do Estado isenção e visão geral, tendo em conta a sociedade como um todo, à qual deve prestar contas. Não se nega a necessidade de se incluir nos programas educacionais, a questão relativa à sexualidade, em seus multifacetados aspectos. Cabe, no entanto, aos órgãos estatais a responsabilidade de fazê-lo de modo pensado e comedido, não se deixando levar pelos grupos os quais pretendem, mais do que a defesa de uma orientação sexual, o convencimento dos demais, à custa de maciça propaganda veiculada de forma ostensiva. Definitivamente, temos que admitir nossa inabilidade para conduzir processos históricos sem nos deixar levar pelos extremos.

    Neste ponto, é urgente fixar: O Estado não é apenas laico; é também o guardião de todos os direitos, de todas as tendências, por mais contraditórias entre si. O equilíbrio e a temperança devem pautar o agir público em campo tão nevrálgico.

    Por isso merece aplausos a atitude da Presidente Dilma Rousseff ao suspender a veiculação do material, porque produzido sem uma larga discussão no seio da sociedade.

    Por certo a vinda de outros olhares permitirá as necessárias adequações. Contemplar-se-á, a um só tempo, todos os legítimos interesses em disputa, e se produzirá um material educativo, de boa qualidade, esclarecedor e adequado ao público a ele destinado. Tudo sem implicar indevida intromissão estatal, quer na livre disposição das pessoas, quer nos valores religiosos constitucionalmente consagrados. Afinal, a virtude está e sempre estará, como lembravam os romanos, no meio-termo.

    Fonte: MPF/RO

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